A Leishmaniose num doente felino com apenas uma manifestação clínica: a diarreia crónica

13 June 2023 -

A Leishmaniose é uma doença cuja informação sobre os aspetos epidemiológicos e clínicos em gatos é limitada. Apesar disso, aparenta ser uma doença emergente nesta espécie.

A sintomatologia da doença em gatos é rara e normalmente reflete-se através de manifestações cutâneas e oculares, com ou sem envolvimento visceral. A diarreia é um sinal clínico muito pouco comum e em cães é frequentemente relacionado com doença renal crónica.

Neste case report, os autores descrevem o caso de um gato de 10 anos, macho esterilizado que foi apresentado a consulta por motivos de diarreia crónica. O animal apresentava sintomatologia com duração de 4 semanas, não responsiva a alteração de dieta e tratamento com antibiótico.

Ao exame físico foi notado linfadenomegalia generalizada. Nas análises o animal apresentava anemia não regenerativa e proteinuria ligeiras. Foi instituído um tratamento empírico com fenbendazole (50mg/kg uma vez por dia durante 5 dias), dieta hidrolisada e probióticos.

Apesar de uma melhoria inicial, a diarreia persistiu e a anemia agravou. Exames adicionais foram realizados e os resultados obtidos foram todos normais. O animal foi submetido a uma ecografia abdominal que revelou um baço aumentado e com aspeto de favo de mel. Foi realizada citologia ao baço e linfonodos e foram detetadas formas amastigotas de Leishmania spp. Posteriormente realizou-se citologia de medula óssea onde se detetaram também as mesmas formas . Anticorpos anti-Leishmania spp. foram detetadas através de imunofluorescência numa titulação de 1:160.

Após as alterações observadas, o animal foi diagnosticado com Leishmaniose. Foram ainda realizadas biópsias gastrointestinais (GI) por endoscopia para descartar doenças GI primárias concomitantes. Após análise das amostras foram também detetadas formas amastigotas do protozoário ao longo do trato GI e foram confirmadas com coloração imunohistoquímica. Foi estabelecido um diagnóstico definitivo de gastroenterite granumolatosa por Leishmaniose.

O animal foi tratado com alopurinol (10mg/kg duas vezes por dia) e um suplemento dietético (Impromune® ½ comprimido via oral a cada 24 horas). Após um mês de tratamento, a diarreia tinha resolvido, o animal aumentou de peso e o rácio proteína creatinina tinha normalizado.

A diarreia, como consequência de uma infeção por Leishmania spp. em cães é normalmente secundária a doença renal. Em gatos, nunca tinha sido reportado como sinal clínico primário.

Doenças concomitantes que podem levar a imunossupressão podem favorecer a infeção por Lieshmania spp em gatos. No entanto, após vários exames realizados, isso não foi detetado.

Uma reflexão importante a retirar é a necessidade da realização de biópsias intestinais em animais em zonas endémicas deste parasita descarte destes microrganismos em casos não responsivos a terapia empírica. É frequente a administração de terapia imunossupressora nestas situações em que existem restrições financeiras e este tipo de tratamento pode ser prejudicial nestes casos.

Este caso relata um gato com diarreia como sinal clínico primário causado por uma infeção por Lieshmania spp. Por ser uma doença rara em gatos, pode ser subdiagnosticado e é importante considerá-la como diferencial nestes animais com esta sintomatologia em zonas endémicas.